terça-feira, 25 de setembro de 2012

Desempenho de Dois Modelos de Predição Prognóstica em Pacientes Críticos na Unidade de Tratamento Intensivo Oncológica


Desempenho de Dois Modelos de Predição Prognóstica em Pacientes Críticos na Unidade de Tratamento Intensivo Oncológica
Performance of Two Prognostic Scores in Critically ill Patients in the Oncological Intensive Care Unit

Nádia Gomes Batista dos Santos I, José Alexandre Pires de Almeida II Daniel Salgado Xavier III

I Pós-graduanda em Fisioterapia Intensiva pela Sociedade Brasileira de Terapia Intensiva – Manaus, AM, Brasil
II Pós-graduando em Fisioterapia Intensiva pela Sociedade Brasileira de Terapia Intensiva – Manaus, AM, Brasil
III Mestre Fisioterapeuta, Coordenador-chefe do serviço de Fisioterapia da Unidade de Tratamento Intensivo da FCECON, Manaus , AM, Brasil

Endereço para correspondência (Correspondence to):
Dr. José Alexandre Pires de Almeida
Rua Pedrarias de Avilar, 1003 – Conjunto 31 de Março
Japiim
69077-4500
(92)8178-8906/3237-6872 - Manaus, AM


Resumo
Os pacientes oncológicos criticamente enfermos geralmente estão propensos à internação na unidade de terapia intensiva (UTI) e consequentemente apresentam prognósticos desfavoráveis. A seguinte pesquisa teve como objetivo avaliar os escores de dois modelos de predição prognóstica (APACHE II e SAPS III) e discorrer com a comparação direta e paralela de seus resultados, para observações sobre níveis de discrepâncias entre os escores obtidos de taxa de morbidade e mortalidade na UTI. Trata-se de um estudo prospectivo realizado na UTI da Fundação Centro de Controle em Oncologia do Amazonas – FCECON onde foram incluídos dados nosológicos de 18 pacientes. O prognóstico preditivo APACHE II evidenciou uma média total de 22,61% de probabilidade para mortalidade sem discriminação de alta ou óbito, assim como o SAPS III apresentou uma média de 54,33% pelos mesmos critérios de discriminação do modelo anteriormente citado. Os modelos comparados tiveram uma discriminação irregular que subestimaram a letalidade na UTI. Quando aplicados aos pacientes com câncer, os escores de prognóstico gerais apresentam desem­penho insatisfatório, em especial devido à má calibração e tendência à subestimação da letalidade.
Descritores: Unidade de terapia Intensiva, APACHE II, SAPS III, oncologia.
Abstract
The critically ill cancer patients are often prone to admission in the Intensive Care Unit (ICU) and therefore have an unfavorable diagnosis. The following research has as a main goal the evaluation of the scores of two prognosis models (APACHE II and SAPS III) by discoursing and comparing its parallel and direct results due to a comment on levels of discrepancies between the scores of morbidity and mortality in the ICU.
This is a prospective study realized in the Intensive Care Unit at Fundação Centro de Controle em Oncologia do Amazonas – FCECON (Amazonas’ Cancer Control Center Foundation) which included nosological data of 18 patients. The predictive prognostic model APACHE II showed an overall average of 22,61% death probability without discrimination between discharge or death, as well as the SAPS III model had an overall average of 54,33% due to the same discrimination criteria mentioned previously. The compared models had an irregular discrimination that underestimated mortality in the ICU. When applied due to cancer patients, the general prognostic scores have poor performance, especially due to poor calibration and a tendency  to underestimation of mortality
Key-words: Intensive Care Unit, APACHE II, SAPS III, Oncology

Introdução
Os pacientes oncológicos criticamente enfermos geralmente estão propensos à internação na unidade de terapia intensiva (UTI) e consequentemente apresentam prognósticos desfavoráveis por conta das inúmeras disfunções orgânicas que acompanham a doença neoplásica. O conhecimento da epidemiologia e das características associadas com o prognóstico destes pacientes depende de fatores multidimensionais (características clínicas e laboratoriais); como a doença de base, tipos de tratamentos implantados, imunossupressão e porte da cirurgia. (1,2)            
Os diversos modelos de predição prognósticas desenvolvidos quantificam e reduzem as variáveis relacionadas com o estado do paciente a um único valor, geralmente, um escore de pontos (3). Embora não devam ser empregados para a predição de um prognóstico individual, estes modelos podem ajudar nas discussões clínicas posteriores, melhoria da alocação de recursos e estratificação de pacientes em estudos clínicos. (1,4)
Portanto este estudo teve por objetivo avaliar os escores de dois modelos de predição prognóstica (APACHE II E SAPS III) e discorrer uma comparação direta e paralela de seus resultados, para observações sobre níveis de possíveis discrepâncias entre os escores obtidos de taxa de morbidade e mortalidade na UTI.  


Metodologia

A seguinte pesquisa foi conduzida no período de novembro de 2011 a janeiro de 2012, na UTI da Fundação Centro de Controle em Oncologia do Amazonas – FCECON. Foram incluídos prospectivamente 18 pacientes, com o preenchimento dos dados solicitados em cada molde prognóstico. Caso houvesse insuficiência de dados para total preenchimento dos modelos prognósticos ou o paciente fosse readmitido na UTI seriam automaticamente excluídos do estudo.  
Por tratar-se de um cluster do Ministério da Saúde em parceria com o Hospital do Coração de São Paulo, as inferências de dados já foram previamente autorizadas pela Fundação na qual o estudo foi aplicado. A coleta de dados foi realizada pelos fisioterapeutas participantes do estudo após óbito ou alta viva dos pacientes.
O modelo APACHE II é um dos mais utilizados no mundo, e foi desenvolvido para pacientes críticos na idade adulta. No presente estudo foi utilizado o modelo modificado pela Sociedade Brasileira de Terapia Intensiva – SOBRATI, o qual é composto de quatorze itens, vindo a fornecer um nível provável de óbitos de acordo com os dados clínicos colhidos e exames laboratoriais.(4,5,6) O índice prognóstico SAPS III (Escore fisiológico agudo simplificado) tem como função a mesma do APACHE II, porém apresenta três categorias subdivididas em vinte itens, ambos utilizam um sistema de pontos que fornecem automaticamente um resultado conjugado em porcentagem. (6)

Resultados

De acordo com os dados obtidos e a partir da seleção dos dezoito pacientes que preencheram os critérios de inclusão no estudo, podemos observar (tabela 01) que 72,22% são do sexo masculino e 27,77% são do sexo feminino com média total de idade de 53,88 anos, permanecendo por um período médio de 5,38 dias na UTI. A taxa de letalidade na unidade foi de 22,22%.
            O prognóstico preditivo APACHE II evidenciou uma média total de 22,61% de probabilidade para mortalidade sem discriminação de alta ou óbito, assim como o SAPS III apresentou uma média de 54,33% pelos mesmos critérios de discriminação do modelo anteriormente citado.
            Em análise comparativa entre altas e óbitos, dos índices preditivos, destacamos a probabilidade de óbito no modelo APACHE II, para pacientes que obtiveram alta clínica, de 15,07% e para pacientes que foram a óbito de 49%. Para o modelo SAPS III foram observados 22,68%, para pacientes que obtiveram alta, e 52,73% para óbitos.
           
Característica
Total
Altas
Óbitos
Total de pacientes
18 (100%)
14 (77,77%)
4 (22,22%)
Sexo Masculino (%)
72,22%
76,92%
23,07%
Sexo Feminino (%)
27,77%
80%
20%
Média de Idade (anos)
53,88
57,14
42,85
Score APACHE II
17,27
15.14
24,75
Mortalidade APACHE II (%)
22,61%
15,07%
49%
Score SAPS III
29,13
47,07
69
Mortalidade SAPS III (%)
54,33%
22,68%
52,73%
Dias de internação na UTI (dias)
5,38
3,07
13,5
Tabela 01. Características demográficas e clínicas. (n =18)

O resultado da análise entre os dois modelos pode ser observados nas figuras 01 e 02, onde é notável que, para a maioria dos pacientes, o índice SAPS III apresentou maiores porcentagens e escores para o risco de óbito.
Figura 01. Porcentagem de risco de letalidade dos dois modelos preditivos utilizados (APACHE II e SAPS III)

                    
                  Figura 02. Escores de risco de letalidade dos dois modelos preditivos utilizados (APACHE II e SAPS III)


 Discussão

Alguns estudos mostraram que o paciente oncológico crítico está apresentando uma sobrevida cada vez mais elevada e com melhores prognósticos. (1,8) O desempenho dos modelos prognósticos abrange duas medidas objetivas: calibração e discriminação, referindo-se a proximidade quanto às probabilidades de letalidade correlacionadas aos óbitos observados no intervalo das probabilidades. A discriminação aponta, entre os indivíduos analisados, quem poderá evoluir para uma alta clínica ou para um óbito. Nenhum modelo apresenta calibração perfeita e uma discriminação exata. (10)
No presente estudo, os modelos comparados tiveram uma discriminação irregular que subestimaram a letalidade na UTI. Os prognósticos do SAPS III, para óbitos, foram mais desfavoráveis; apresentando uma média de percentuais de óbitos de 52,73%, e em contrapartida o APACHE II apresentou uma média de 49%. Na tabela 01 é observado que o índice preditivo SAPS III, parece ser mais fidedigno nos casos em que houve a letalidade, porém a amostra é limitada, não sendo suficiente para a veracidade de tal afirmação.
Quando aplicados aos pacientes com câncer, os escores de prognóstico gerais apresentam desem­penho insatisfatório, em especial devido à má calibração e tendência à subestimação da letalidade. (9)

Considerações finais

A mensuração do prognóstico de letalidade, pode ser util para enriquecer discussões sobre os modelos e identificar a gravidade de pacientes oncológicos em estudos clínicos.
Concluimos que, neste grupo de pacientes o SAPS III foi mais fidedigno nos casos em que houve letalidade e apresentou melhor discriminação.

Referencias Bibliográficas

1. Kress JP, Christenson J, Pohlman AS, Linkin DR, Hall JB. Outcomes of critically ill cancer patients in a university hospital setting. Am J Respir Crit Care Med 1999; 160:1957-1961.

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5. Morenno R. The customization of APACHE II for patients receiving orthotopic
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6. Hospital do Coração - Associação do Sanatório do Sírio - SAPS III Sistema de pontuação de mortalidade estima (Simplified Acute Physiology Score III) -  https://servicos.hcor.com.br/Qualiti

7. APACHE II Sistema de pontuação de mortalidade estimada (Acute Physiology and Chronic Health disease Classification System II) - Criação e adaptação Douglas Ferrari - Médico Intensivista com L.Leff MD -  www.medicinaintensiva.com.br®

8. Groeger JS, Lemeshow S, Price K, Nierman DM, White P Jr, Klar J, Granovsky S, Horak D, Kish SK. Multicenter outcome study of cancer patients admitted to the intensive care unit: a probability of mortality model. J Clin Oncol, 1998; 16:761-770.

9. Sculier JP, Paesmans M, Markiewicz E et al - Scoring systems in cancer pa­tients admitted for an acute complication in a medical intensive care unit. Crit Care Med, 2000;28:2786-2792.

10. Y. Sakr, C. Krauss, A. C. K. B. Amaral, A. Re´a-Neto, M. Specht, K. Reinhart  and G. Marx. Comparison of the performance of SAPS II, SAPS 3, APACHE II, and their customized prognostic models in a surgical intensive care unit. British Journal of Anaesthesia, 2008; 101 (6): 798–803.


quarta-feira, 19 de setembro de 2012

DESMAME VENTILATÓRIO DA UNIDADE DE TRATAMENTO INTENSIVO WEANING OF INTENSIVE CARE UNIT





DESMAME VENTILATÓRIO DA UNIDADE DE TRATAMENTO INTENSIVO
WEANING OF INTENSIVE CARE UNIT
Adria Marques, Fernando Val, Gabrielle Araújo, Juliana Maués, Marlon Barbosa, Nayana Alves1



RESUMO                                                  
O suporte ventilatório invasivo por tempo prolongado acarreta inúmeras complicações ao indivíduo, pois geram alterações em sua fisiologia respiratória, oque leva a comprometimentos nos sistemas muscular, cardiovascular e respiratório e consequentemente, aumento de sua permanência na unidade de tratamento intensivo.  O desmame ventilatório compreende o processo de transição da ventilação artificial para a espontânea e deve ser realizado de forma gradativa e individual levando em consideração a situação clínica de cada paciente. Entre as várias técnicas descritas na literatura conhecidas para o desmame, destacam-se três como tendo maior eficácia e sendo as mais utilizadas: Tubo T (sistema de macronebulização contínua com fluxo de oxigênio); SIMV (Ventilação mandatória Intermitente Sincronizada); PSV (Ventilação com Suporte Pressórico). O fisioterapeuta junto à equipe multidisciplinar deve avaliar a técnica e o momento mais adequado para iniciar o processo de interrupção do suporte ventilatório, considerando condições como a reversão da causa que levou a necessidade da ventilação mecânica, estabilidade hemodinâmica, drive respiratório, entre outros critérios que auxiliam no sucesso do processo de desmame ventilatório. A presente pesquisa objetivou: Identificar, analisar e estudar os protocolos de desmame ventilatório no paciente adulto na unidade de tratamento intensivo tendo sido realizado por meio de uma revisão da literatura. Foram admitidos ensaios clínicos publicados entre 2002 e 2012. A busca envolveu as bases de dados LILACS, SciELO, MedLine, usando os descritores: “mechanical ventilation weaning”, “mechanical ventilation”, “intensive care unit”.
I Especializandos em Fisioterapia em Terapia Intensiva pela Sociedade Brasileira em Terapia Intensiva – AM.



 
_____________________________________
Palavras - Chave: Desmame ventilatório, Unidade de Tratamento Intensivo, Protocolo de Desmame.

ABSTRACT

Invasive ventilatory support for prolonged periods leads to numerous complications, with changes in their respiratory physiology, leading to impairments in the muscular, cardiovascular and respiratory systems and consequently increasing the stay in the intensive care unit. The ventilator weaning is the process of transition from mechanical ventilation to spontaneous breathing and should be carried out gradually and individually by taking into consideration the clinical situation of each patient. Among the various techniques described in the literature, three stand out as being more widely used: T tube (humidifier with large reservoir system on continuous oxygen flow); SIMV (Synchronized Intermittent Mandatory Ventilation), PSV (pressure support ventilation). The decision to wean a patient from the ventilator depends on the patient’s clinical condition and psycological state.  The physiotherapist among a multidisciplinary should evaluate the optimal technique and the most appropriate time to start the process of weaning from ventilatory support considering conditions as the reversal of the cause that led to the need for mechanical ventilation, hemodynamic stability, respiratory drive, among other criteria that assist in the success of the process of weaning. This research aimed to: Analyze the weaning protocols in adult patients in the intensive care unit and was conducted through a literature review. Studies published between 2007 and 2012 were screened. The search involved the databases LILACS, SciELO, MEDLINE, using the keywords "mechanical ventilation weaning", "mechanical ventilation", "intensive care unit".
Key - Words: Weaning ventilation, Intensive Care Unit, Weaning Protocol.

INTRODUÇÃO

O desmame da ventilação mecânica ainda representa um desafio nas Unidades de Terapia Intensiva (UTI), estando intimamente relacionado a altos índices de complicação e mortalidade. O período de transição da ventilação artificial para a espontânea é um momento delicado e a necessidade de uma abordagem individual se faz necessária. Durante o processo de desmame ventilatório podem ocorrer inúmeras complicações quando há uma dependência respiratória1.
A permanência do paciente em assistência ventilatória deriva da incapacidade em manter adequada troca gasosa ou/e falência da bomba ventilatória. Estes fatos podem ser resultados de doença pulmonar (pneumonia, doença pulmonar crônica, asma e outros) ou extrapulmonar, mais notadamente do sistema nervoso central ou do sistema cardiovascular. Outras situações como desnutrição, distúrbios eletrolíticos, polineuropatia do paciente crítico reduzem a capacidade contrátil da musculatura ventilatória e devem ser identificadas. Nestas circunstâncias torna-se fundamental a busca da reversibilidade (total ou parcial) do processo que motivou a ventilação mecânica dentro da estratégia do desmame2,3.
Quando o desmame é adequadamente conduzido, podem ocorrer repercussões diretas na evolução do paciente submetido à ventilação mecânica, promovendo uma queda considerável no tempo de desmame, na duração da ventilação mecânica, na diminuição do número de traqueostomias e re-intubações, diminuição no custo total da internação do paciente, já que há uma diminuição do tempo de estadia do mesmo na Unidade de Terapia Intensiva e no hospital, além de aumentar a quantidade de vidas salvas4. As equipes devem estar atentas para que a liberação do paciente da ventilação mecânica possa ser realizada o mais rápido possível, com planejamento adequado e seguro. O Controle da causa que determinou o início ou manutenção do suporte ventilatório é um fator muito importante a ser considerado antes do início do processo de interrupção5,3. Portanto, a descontinuação do suporte ventilatório e a extubação devem ser realizados assim que o pacientes esteja apto a manter sem ajuda externa a respiração espontânea e a proteger suas vias aéreas.  
Alguns estudos comparam as melhores técnicas a serem utilizadas no processo de desmame ventilatório: Com Tubo-T, PSV ou SIMV5,6,7. Frente à diversidade dos parâmetros existentes para retirada da prótese ventilatória e dos instrumentos disponíveis para a sua obtenção na prática clínica, é possível que ocorram variações significativas nos métodos e critérios utilizados pelos profissionais atuantes nas Unidades de Terapia Intensiva7.
O objetivo deste estudo foi identificar, analisar e estudar os protocolos de desmame ventilatório mais comumente utilizados em UTIs adultas no Brasil.  


MATERIAIS E MÉTODOS

A busca dos artigos envolvendo o desfecho clínico pretendido foi realizada nas bases de dados Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Sáude (LILACS), Scientific Eletronic Library Online (SciELO) e Medical Literature Analysis and Retrieval Sistem Online (MedLine/Pubmed). Os artigos foram obtidos por meio de bucas utilizando as palavras-chave: “mechanical ventilation weaning”, “mechanical ventilation”, “intensive care unit”, “weaning protocol” Estudos adicionais foram identificados por pesquisa manual das referências obtidas nos artigos.
A busca de referências se lmitiou a artigos originais e ensaios clínicos escritos em português, inglês ou espanhol, e publicados nos últimos 10 anos (2002 a 2012).

Segue abaixo a Revisão de Literatura:


  1. CONCEITO

O termo desmame é usado para descrever a retirada gradual do suporte ventilatório em pacientes que apresentem melhora clínica. Entretanto existem pacientes aptos a assumir de forma total e imediata a ventilação espontânea. Assim, o tempo em que o paciente estaria em “processo” de desmame levaria a um aumento de tempo do paciente em VM, dentro da UTI, bem como do hospital e assim, gerando aumento de complicações e gastos. Hoje em dia o termo desmame é utilizado para todas as formas de retirada de suporte ventilatório embora seja mais correto o termo descontinuação do suporte ventilatório (DSV).

  1. COMPLICAÇÕES RELACIONADAS A UTILIZAÇÃO DA VENTILAÇÃO MECÂNICA INVASIVA POR TEMPO  PROLONGADO

Apesar de ser uma intervenção importante no paciente com insuficiência respiratória aguda, a ventilação mecânica pode induzir diversas complicações, que podem aumentar a morbimortalidade de um paciente grave, portanto, é importante abreviar o tempo no qual o paciente está sob ventilação artificial invasiva, restabelecendo a ventilação espontânea tão logo seja possível4,8. Aproximadamente um terço dos pacientes internados em Unidades de Terapia Intensiva necessita de intubação e instituição de ventilação com pressão positiva. O manuseio da ventilação nos pacientes deve buscar dois objetivos: a descontinuação da ventilação mecânica e a remoção da via aérea artificial. Diversos estudos demonstraram que a ventilação mecânica impõe maiores riscos ao paciente, tais como a lesão pulmonar, a pneumonia nosocomial, o trauma da via aérea, a sedação desnecessária a atrofia muscular respiratória, o que promove o aumento do tempo de ventilação mecânica, da internação e dos custos hospitalares, elevação da pressão intracraniana (PIC), falência respiratória, diminuição do débito cardíaco, alcalose respiratória aguda, distensão gástrica maciça, barotrauma, a pneumonia associada à ventilação mecânica apresenta alta influência na taxa de mortalidade1,7.
A manutenção da prótese ventilatória deve ser sempre questionada e os parâmetros utilizados para ventilar o paciente devem ser definidos com a preocupação de não levar à lesão alveolar através da hiperdistensão. Após a recuperação do quadro agudo com indicação para a suspensão da VM, a retirada do suporte mecânico invasivo e a extubação devem ser consideradas como objetivos primários na evolução terapêutica do paciente9.

  1. DEPENDÊNDIA DE SUPORTE VENTILATÓRIO.

Muitas são as causas da dependência de um paciente para com um suporte ventilatório e nem sempre a manutenção do mesmo é a causa que originou a intubação.
Existem diversos fatores que podem levar a dependência de suporte ventilatório sendo crucial a correta identificação do fator que está levando a persistência desta necessidade para uma boa evolução do paciente.

3.1  Fator neurológico. A disfunção do centro respiratório seja por alterações de ordem estruturais (acidente vascular encefálico) ou metabólicas (distúrbios eletrolíticos e sedação) acarreta alterações na capacidade de gerar impulsos nervosos com consequente perda da capacidade de ativação correta da musculatura respiratória. 
3.2  Disfunção neuromuscular do paciente crítico: é a mais comum das desordens neuromusculares que se encontra em UTIs. Possui prevalência entre 50% e 100% sendo associada à gravidade do doente. Apresenta-se como uma fraqueza bilateral, simétrica e mais acentuada em porções proximais. Estudos demonstram diminuição de amplitude do potencial de ação, perda de fibras do tipo II e filamentos de miosina tanto de musculatura periférica como de musculatura respiratória. A contribuição desta entidade com a VM prolongada e falha na DSV é objeto de estudos onde se observa associação entre elas.
3.3  Capacidade e demanda: o desempenho da bomba ventilatória pode ser prejudicado por fraqueza da musculatura respiratória. Esta fraqueza pode se dar por diversas causas entre elas, inatividade, miopatia e a própria neuropatia do paciente crítico. Tais alterações podem ser advindas de maus ajustes no VM e que normalmente acarretam assincronia levando ao excesso de trabalho muscular e consequentemente fadiga. Uso de VM por tempo prolongado leva a perda da capacidade de gerar força pelo diafragma. Estresse oxidativo e proteólise são os fatores preponderantes nestes casos.
3.4   Fatores nutricionais: o estado metabólico do paciente muitas vezes está alterado devido à patologia vigente levando ao consumo aumentado de oxigênio pelo organismo por exemplo. A desnutrição está associada às alterações histoquímicas e funcionais do aparelho respiratório e que por sua vez, limitam a capacidade de respiração espontânea.
3.5  Hematose: o desequilíbrio nos processos de troca gasosa com alteração da relação ventilação/perfusão aumenta a demanda ventilatória do paciente.
3.6  Disfunção cardiovascular: o processo de DSV leva a um aumento da carga de trabalho global do paciente. Assim, a transição de ventilação com pressão positiva para pressão negativa, a existência de disfunção cardiovascular conhecida, ou muitas vezes, desconhecida, como nos casos de disfunção adquirida durante internação, pode levar ao surgimento de eventos pulmonares que acabam por dificultar a DSV.


  1. IDENTIFICAÇÃO DE PACIENTES PARA DSV E CRITÉRIOS

Previamente à retirada do suporte ventilatório deve-se avaliar e/ou otimizar alguns critérios e condições clínicas. Minimização de carga de trabalho com repouso muscular, tratamento de infecções, atelectasias, broncoespasmos, além de boa higiene brônquica, suporte nutricional devem ser levados em conta como previamente relatado.
Existe a necessidade de avaliação dos critérios para DSV diária e rotineira para a identificação precoce de pacientes aptos a suportar respiração espontânea. Nesta avaliação os pacientes devem obedecer aos seguintes critérios:
Reversão da causa que levou ou mantém a necessidade de ventilação mecânica através de avaliação clínica; nível de consciência adequado com escala de coma de Glasgow superior a 9; estabilidade hemodinâmica (FC < 140 bpm, ausência de isquemia miocárdica, ausência de hipotensão (drogas vasoativas: doses <5 38="38" a="a" acas="acas" arritmias="arritmias" aus="aus" b="b" card="card" controladas="controladas" de="de" dist="dist" drive="drive" emperatura="emperatura" febre="febre" hemoglobina="hemoglobina" hidroeletrol="hidroeletrol" kg="kg" min="min" ncia="ncia" presen="presen" rbios="rbios" respirat="respirat" rio="rio" ticos="ticos" ug="ug">8-10 g/dL); Equilíbrio ácidobásico (pH > 7,25); nível de consciência equivalente ou próximo aquele antes da intubação, ausência de infusão de sedativos, glasgow >13; Exames laboratoriais nos valores aceitáveis; Trocas gasosas satisfatórias (PaO2 > 60 mmHg com FiO2 < 0,4-0,5 e PEEP < 8 cmH20, PaO2 / FiO2 > 150-200  FR < 28 irpm); Capacidade de proteger as vias aéreas; Tosse eficaz (CV > 20 ml/kg. Pimax < -40 cmH20 Pemax > 60 cmH20, Fluxo expiratório > 160 L/min); Pouca quantidade de secreção nas vias aéreas3,10.

  1. TÉCNICAS UTILIZADAS NO PROCESSO DE DESMAME VENTILATÓRIO

Conforme o paciente se torna hábil a realizar ventilação espontânea ele vai sendo capaz de sustentar o trabalho ventilatório e assim, eletivo para o teste de respiração espontânea (TRE). Este TRE é utilizado para avaliar a probabilidade de falha do desmame sendo considerado padrão-ouro para DSV. Três métodos têm sido utilizados como ajuda para o retorno gradual deste paciente à ventilação espontânea e são elas: SIMV, TUBO-T e PSV. Embora no início dos anos 90 acreditava-se que estas técnicas eram igualmente eficientes, hoje sabe-se que algumas prolongam o tempo do paciente em VM de forma desnecessária13.

5.1. TESTE COM A PEÇA T ou TUBO T – Apesar de aumentar o trabalho respiratório em motivo da resistência imposta pelo tubo traqueal e necessitar de maior monitoração da equipe devido à ausência de alarmes, este método é frequentemente utilizado com grande percentual de sucesso. Ela pode ser usada como teste de capacidade de interrupção da VM ou mesmo técnica de desmame, esta se iniciando com por curtos períodos de respiração espontânea, intercalados por períodos maiores para descanso em VM. De acordo com o pacientes, estes intervalos são aumentados. Ele consiste na colocação do paciente conectado a uma fonte de oxigênio umidificada através de um tubo-T obedecendo a um fluxo adequado para manutenção da saturação periférica acima de 92%. Para o teste a averiguação de gases arteriais deve ser feita com 30 minutos sendo que a ventilação deve ser instituída caso constate-se sinais de deterioração de estabilidade clínica e hemodinâmica.  
5.2. TESTE COM PSV – O teste com a PSV consta da adaptação de uma pressão de suporte para um nível de 5 a 7 cmH2O com o intuito de assistir o esforço inspiratório espontâneo do paciente objetivando compensar resistência e a complacência imposta pelo circuito do ventilador. Essas pressões são sugestivas de um teste de ventilação espontânea, mesmo com o paciente acoplado no ventilador mecânico. Isso se deve ao fato de que uma PSV entre 5 e 10 cmH20 vence apenas a resistência do tubo orotraqueal (TOT). A PEEP de 5 cmH20 apenas substitui a PEEP fisiológica3. As vantagens então incluem a compensação do trabalho imposto pelo tubo traqueal, incorporação de SIMV, PSV e PEEP, um padrão de fluxo mais fisiológico e confortável e carga de trabalho mais fisiológico. Dentre as desvantagens podemos citar a incapacidade de assegurar um volume minuto mínimo, ineficiência de ventilação alveolar, devido a variações na complacência e resistência das vias aéreas ou do esforço respiratório para o nível de pressão preestabelecido.
5.3 SIMV – Técnica onde paciente respira de modo espontâneo e recebe ventilações periódicas à pressão positiva com volume corrente e frequência respiratória predeterminados sendo que esta deve ser reduzida gradualmente. A teoria por trás deste método está no racional de que os músculos respiratórios do paciente iriam trabalhar durante as fases espontâneas e descansar durante os ciclos mandatórios. Entretanto pode ocorrer de a musculatura trabalhar de forma exagerada tanto nos ciclos espontâneos quanto mandatórios gerando assincronia e dessa forma prolongando o tempo de DSV e consequentemente o de VM. Dentre as vantagens podemos considerar a menor assistência do terapeuta devido a presená de alarmes e possibilidade de incorporação de pressões de suporte e CPAP.


6.     PROTOCOLO DE DESMAME VENTILATÓRIO

A aplicação de um protocolo de desmame com rigor científico e um método padronizado pode trazer várias vantagens em relação ao desmame empírico. Dentre as vantagens destacam-se a redução significativa no tempo de desmame, redução na relação entre tempo de desmame e tempo total de ventilação mecânica, diminuição dos índices de insucessos e re-intubações, diminuição da mortalidade e menor tempo de internação. O empirismo aplicado no desmame da ventilação mecânica pode levar a piora na qualidade do seu processo e consequentemente a aumento na taxa de falha, morbidade e mortalidade4,8,12 .
A interrupção da ventilação mecânica, ou método do breve teste de respiração espontânea, é a técnica mais simples, estando entre as mais eficazes para o desmame. Faz-se permitindo que o paciente ventile espontaneamente através do tubo endotraqual conectado a  uma peça em forma de T com uma fonte enriquecida de oxigênio ou com ventilação a pressão de suporte (PSV) de 7 cmH20 e deve ser tentado diariamente5. Colombo e colaboradores6 em seu estudo sobre implementação, avaliação e comparação dos protocolos de desmame com tubo –T e PS associada à PEEP em pacientes submetidos à VM por mais de 48 horas em UTI relataram que independente da escolha do método de desmame da ventilação mecânica, da idade, do sexo ou da doença de base, faz-se necessário o estabelecimento de um protocolo de desmame para que se possa garantir maior índice de sucesso e menor incidência de comorbidades nos pacientes internados em UTI e dependentes da ventilação mecânica. 




7.     INDICATIVOS DE SUCESSO E FALHAS NO DESMAME VENTILATÓRIO

Existem diversos parâmetros para predição de sucesso do processo de DSV. Alguns deles são de fácil obtenção e outros são dependentes de cálculos complexos e sofisticados. Foram também desenvolvidos índices integrados que auxiliam neste momento. Entre eles podemos considerar o índice de complacência, frequência respiratória, índice de oxigenação e pressão inspiratória máxima (CROP). Abaixo tabela com parâmetros e índices preditivos de DSV.
Parâmetros
Valores de corte
f
< 30 – 38 irpm
VC
4 – 6 ml/kg
VM
< 10-15 l/min
PIPmáx
>15–30 cmH2O
f/VC
60-105/L
Trabalho resp.
0,75J/l
CROP
>13
Cest
>25 ml/cmH2O
Auto-PEEP
<3cmh2o o:p="o:p">
P(A-a)O2 100%
<350 o:p="o:p">
PaO2/FiO2
>200
VD/VT
<0 o:p="o:p">
FC
>70 e <120bpm o:p="o:p">
PAM
>70 e <110mmhg o:p="o:p">



8.     CONSIDERAÇÕES FINAIS

Após a leitura do presente trabalho, pode-se concluir que o processo de descontinuação do suporte ventilatório é complexo, é dependente de diversos fatores e que exige interação multidisciplinar. Todos os fatores do paciente devem ser levados em conta neste momento. A escolha do método também é de grande importância para não prejudicar o paciente neste momento de elevado estresse fisiológico e psicológico. Portanto a realização deste processo com respaldo científico é de grande importância.



REFERÊNCIAS

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Esteban A, Frutos F, Tobin MJ, et al: A comparison of four methods of weaning patients from mechanical ventilation (the Spanish Lung Failure Collaborative Group),N Engl J Med 332:345, 1995.
  1. Esteban A, Frutos F, Tobin MJ, et al. A comparison of four methods of weaning patients from mechanical ventilation (The Spanish Lung Failure Collaborative Group), N Eng L Med 332: 345, 1995.